Mais de mil sírios morreram em detenção em um aeroporto militar nos arredores de Damasco, capital da Síria, mortos por execução, tortura ou maus-tratos em um local que era amplamente temido, segundo relatório a ser publicado nesta quinta-feira (27) que rastreou as mortes em sete supostos locais de sepultura.
No documento, compartilhado exclusivamente com a Reuters, o Centro de Justiça e Responsabilidade da Síria afirma que identificou os locais das sepulturas usando uma combinação de depoimentos de testemunhas, imagens de satélite e documentos fotografados no aeroporto militar no subúrbio de Mezzeh, em Damasco, após a saída do presidente Bashar al-Assad em dezembro do ano passado.
Alguns locais estavam no terreno do aeroporto. Outros pela capital.
Shadi Haroun, um dos autores do relatório, informou que estava entre os prisioneiros.
Detido por vários meses em 2011-2012 por organizar protestos, ele descreveu interrogatórios diários com tortura física e psicológica com o objetivo de forçá-lo a fazer confissões infundadas. A morte vinha de várias formas, relatou ele à Reuters.
Embora os detentos não vissem nada além das paredes de suas celas ou da sala de interrogatório, eles podiam ouvir “disparos ocasionais, tiro a tiro, a cada dois dias”.
Além disso, havia os ferimentos infligidos por torturadores.
“Um pequeno ferimento no pé de um dos detentos, causado por uma chicotada que ele recebeu durante a tortura, não foi esterilizado ou tratado por dias, o que gradualmente se transformou em gangrena e sua condição piorou até chegar ao ponto de amputação de todo o pé”, relembrou Haroun, descrevendo a situação de um companheiro de cela.
Além de obter os documentos, o Centro de Justiça e a Association for the Detained and Missing Persons in Sednaya Prison entrevistaram 156 sobreviventes e oito ex-membros da inteligência da Força Aérea, o serviço de segurança da Síria encarregado de vigiar, prender e matar os críticos do regime.
O novo governo emitiu um decreto proibindo ex-autoridades do regime de falar publicamente e nenhum deles estava disponível para comentar.
“Embora algumas das sepulturas mencionadas no relatório não tenham sido encontradas antes, a descoberta em si não nos surpreende, pois sabemos que há mais de 100 mil pessoas desaparecidas nas prisões de Assad que não saíram durante os dias de libertação no início de dezembro”, explicou um coronel do Ministério do Interior do novo governo que se identificou com seu pseudônimo militar, Abu Baker.
Segundo Baker, “descobrir o destino dessas pessoas desaparecidas e procurar por mais túmulos é um dos maiores legados deixados pelo regime de Assad”.
Estima-se que centenas de milhares de sírios tenham sido mortos desde 2011, quando a repressão de Assad aos protestos se transformou em uma guerra em grande escala.
Tanto Assad quanto seu pai Hafez, que o precedeu como presidente e morreu em 2000, há muito tempo são acusados por grupos de direitos humanos, governos estrangeiros e promotores de crimes de guerra de assassinatos extrajudiciais generalizados, incluindo execuções em massa dentro do sistema prisional do país e uso de armas químicas contra o povo sírio.
O Centro de Justiça disse que todos os sobreviventes entrevistados foram torturados.