a luta pela água que mantém a vida


A mudança do asfalto para uma rua de terra batida com cascalhos improvisados acusa a chegada à maior ocupação urbana de Mato Grosso do Sul: a Homex. No bairro Vivendas do Parque, em Campo Grande, cerca de 6 mil pessoas, em 3 mil casas, se dividem entre a recém-passada incerteza de ter um lar com o sentimento de dignidade.

Pastora Célia mora há seis anos na Homex. (Foto: José Câmara).

A história é longa e tem vários capítulos. O que se encontra hoje no bairro na região sul da capital sul-mato-grossense é completamente diferente daquilo que se via há poucos anos. Como uma comunidade, os moradores da Homex lutaram por oportunidades, souberam lidar com a política nua e crua e fizeram concessões para terem direitos básicos assegurados. 

“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a Segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”.

Constituição Federal Brasileira

O olhar muda quando realidades se chocam. O copo de água não tem o mesmo valor e sabor entre os moradores distintos de Campo Grande. “É como desabrochar de uma rosa, a água que chega cura. Tudo isso me trouxe vida de volta. Devolveu minha vida. O lar que eu tenho me trouxe dignidade”, disse uma paraibana, de 54 anos, na porta de entrada de casa. 

Nesta reportagem multimídia, você vai ler, ouvir e assistir sobre:

  • Homex: a maior ocupação urbana de Mato Grosso do Sul;
  • “Quer um copo d’água?” – a água que mantém a vida;
  • Dignidade habitacional: um direito garantido na constituição;
  • Água e esgoto tratados são sinônimo de saúde; 
  • Políticas para o acesso à água asseguram a vida. 

Homex: a maior ocupação urbana de Mato Grosso do Sul

Literalmente, tudo era mato! É em um tom de descobrimento, que começa a história da maior ocupação urbana de Mato Grosso do Sul. As primeiras famílias começaram a chegar ao grande terreno por volta de 2012. Veja reportagem audiovisual no vídeo acima.

“Quando cheguei aqui, a Homex era um lugar de incerteza. Era um barraco aqui, outro barraco ali. Eram barracos mesmo. Você pega quatro pedaços de árvore, cerca com lona e coloca umas telinhas em cima. Você olhava para um lugar de incerteza. Porém, de outro lado, era uma oportunidade. Nunca tive nada regular no meu nome. Sempre com a moto atrasada, morando com mãe ou outros parentes. Aqui era um barraco, mas era meu”. 

Quem narra a fala acima sobre o conjunto habitacional é Leo, um homem de meia idade que carrega muito mais vivências do que aquilo que seria traçado no próprio curso da vida. Atualmente, Leodomar Rodrigues é o presidente do bairro e conduz a associação das famílias da Homex.

O nome dado ao lugar é o mesmo da empresa mexicana, que tinha o espaço como propriedade. Atualmente, Homex, é mais que o nome de uma comunidade, é uma sociedade unida em prol da dignidade.

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Leo é líder comunitário da Homex. (Foto: José Câmara).

Na camisa, Leo carrega estampada a união entre os moradores da Homex. Sentado em uma banco de madeira sob uma sombra de um puxadinho de um mercado, o presidente da associação do bairro remonta a história sobre a ocupação do espaço. As lembranças são cheias de cicatrizes, na pele ou até mesmo nas memórias revisitadas.

Para ter um marco temporal, a história da Homex começa em 2011, quando um empreendimento, do mesmo nome, chega à região sul de Campo Grande para construir um conjunto habitacional. Após dois anos, as obras foram abandonadas pelos gringos.

No que seria um empreendimento, a previsão era a construção de dez blocos residenciais. Porém, apenas seis foram entregues. Com a falência da construtora, muitas famílias ficaram em meio aos escombros e o espaço cercado, começou a ser ocupado.

“Quando cheguei, vi um líder cavando um buraco para estourar um poço, eu olhei e vi nele um exemplo. Eu só queria agregar a liderança. Peguei o ritmo. Sentei, ajustamos uma associação e começamos a negociação com a prefeitura. Levamos o problema, tentando achar uma solução. Eu fui crescendo. Eu escutava o problema na comunidade e chegando na gestão municipal, passava a linguagem do meu bairro ao município. Eu entendia a situação para depois repassar o problema”, lembra Leo.

Várias famílias foram se agrupando como uma comunidade. O desejo era um: ter uma casa digna, um espaço para viver com tranquilidade. Não demorou muito para os barracos serem erguidos, juntos dos sonhos de milhares de famílias. 

Para levantar um barraco era preciso quatro grandes troncos de madeira e vários metros de lona, como Leo comenta. O chão batido era o piso. Apenas a luz do sol conseguia acusar que um novo dia começava. A água para o tereré não era gelada. 

Longe de uma visão de superação ou que tenta glamourizar direitos básicos, Leo lembra da história do bairro. A luta árdua sempre foi pelo mínimo, um teto, uma água tratada gelada, iluminação, segurança, dignidade.

“Trabalhava fora, ficava minha esposa no barraco. Para fazer o almoço, se manter, a minha esposa ia até uma caixa d’água com garrafas e pegava a água. Na hora do almoço, eu passava na minha mãe, pegava um gelo para conseguir tomar um suco na hora do almoço. Voltava ao trabalho e no fim do dia era a mesma coisa. Chegava aqui e íamos baldear a água. Nós pegávamos uma água boa, teoricamente, que era cedida pela Águas Guariroba”. 

“Quer um copo d’água?” – a água que mantém a vida

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Moradora da Homex, Célia comemora a água que recebe em casa. (Foto: José Câmara).

A 2 minutos de distância, duas ruas antes, mora a pastora Maria Célia de Andrade Rodrigues, de 54 anos. Na porta de casa, escorada no portão da residência, ela abre um sorriso largo que esconde uma verdadeira história de persistência e luta pela vida. Logo nas primeiras frases, Célia, ou a pastora como é conhecida por todos da comunidade, oferece um copo de água. 

“Quer um copo d’água? Tô terminando o almoço”. Aos fundos é possível ouvir um dos netos, ainda pequeno, chorando. Outro menor ainda, puxa a saia da avó, que interrompe a entrevista para dar atenção ao menino. Poucos minutos depois, a pastora se acomoda em frente da casa e começa a narrar a história que tem junto à Homex. 

“A Homex, quando cheguei, morava em um barraco na casa de minha filha. Era uma situação difícil, em tudo. Em água, energia, habitação e tudo. Tudo era difícil. Aqui eu enfrentei um dos piores problemas, a energia e a água. A água era gambiarra. Tinha dia que tinha, tinha dia que não tinha. Tinha dia que os canos entornavam tudinho. A energia, quando faltava, tinha que chamar alguém para mexer”.

Por ser uma ocupação, os direitos básicos à moradia, infraestrutura e dignidade não foram negligenciados apenas à pastora Célio e ao Leo. Mais de 6 mil pessoas dividiram a angústia por um lugar melhor de moradia.

Aquilo que parece simples para uns, é o sonho de muitos outros. Abrir a torneira de casa para tomar um copo de água era algo distante para a pastora Célia. Com problemas de saúde no coração e nos rins, a água era um item vital no tratamento da moradora. 

A água que a pastora Célia consumia era barrenta, uma verdadeira situação insalubre. Com a condição nos rins, beber água deveria fazer com que ela ficasse melhor. “A questão da água era uma aflição. Eu não podia consumir muita água. Ficava toda inchada. Como não era uma água tratada, específica para eu beber, eu tinha medo”.

“Tinha medo recorrente. Eram mangueiras, gambiarras. Quando a água faltava ou as mangueiras se entortavam, a água voltava uma lástima, toda barrenta, cheia de lama, amarela e com sabor de barro. Aí você tinha que esperar aquela água melhorar para poder encher umas garrafas e colocar na geladeira. A espera não podia ocorrer. Eu consumia água daquele jeito. Eu me sentia ruim, mas era por conta da água. Eu não podia ficar esperando. Mas hoje está tudo funcionando, tá tudo lindo”.

Pastora Célia

Mais de 6 mil pessoas viveram em situação degradante até serem contemplados, em 2023, como o processo de regularização fundiário homologado pela Prefeitura de Campo Grande. 

O “hoje” da pastora Célia se tornou diário em março de 2023. A água consumida pelos moradores da Homex vinha de dois caminhos: de poços artesianos perfurados clandestinamente e de uma caixa d’água, distante das residências, oferecida pela concessionária que administra o sistema em Campo Grande. 

Dignidade habitacional: um direito garantido na constituição

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Maria Célia é pastora. (Foto: José Câmara).

O processo de regularização das moradias foi concretizado via prefeitura. Em 3 de julho de 2023, a Águas Guariroba inaugurou as obras de implantação das redes de água tratada e esgoto na Homex. As obras beneficiaram mais de 1,5 mil famílias. 

A concessionária implantou mais de 14 km de rede de esgoto e cerca de 15 km de rede de água. Este processo é sinônimo de dignidade habitacional. 10 anos após o início da ocupação, as famílias puderam ser contempladas com algo que já fazia parte da rotina da maioria dos campo-grandenses.

Evelin Melo é engenheira e especialista em dignidade habitacional. Ela explica que o que ocorreu na Homex é manutenção de um direito que é assegurado pela Constituição Federal. “A moradia, acredito eu, é a porta para os demais direitos: direito à educação, direito à saúde, direito à segurança, e os seus elementos”. 

A especialista explica que o conceito de dignidade habitacional é atrelado ao significado de lar, um ponto de segurança no mundo. “A gente fala de conforto térmico, com eletricidade, com água potável, com infraestrutura urbana, com a questão de uma casa que não tem umidade, que tenha um revestimento, um piso para fácil limpeza. Isso para a gente é a questão da dignidade, onde seja habitável, onde a pessoa se sinta segura, onde seja um ambiente que não seja insalubre, onde não dê doenças nela. Um lugar digno é onde a pessoa pode ter uma comida, fazer de forma bem feitinha. Onde ela possa estar dormindo bem, onde ela possa estar se protegendo da chuva”.

A chuva, a incerteza da moradia, a infraestrutura precária e falta de acesso eram rotina. Hoje, Leo e a pastora Célia se sentem mais seguros. O tereré gelado é uma garantia diária. Poder abrir a torneira e beber um copo d’água não é mais um medo. 

“É um sonho realizado, mesmo após muita luta e batalha. Hoje, você vê uma água encanada, que não tem um gosto estranho, uma água que pode fazer comida sem gosto estranho. Eu tinha medo de não ter saúde. A água eu posso tomar, sabendo que não vou ter problema depois. Sei que meu vizinho ou as crianças do bairro podem tomar e não vão ter problemas depois”, comentou Leo.

A chegada do sistema hídrico tratado e assegurado trouxe vida para a pastora Célia, como ela mesma define. “Eu só sei dizer, que depois da chegada da água limpa, eu tenho uma água tratável. Não sei como explicar. Quando eu soube que ela estava vindo, eu fiquei contando os dias para a água passar na porta da minha casa. Eu ficava meditando e esperando a água na minha torneira”. 

Atrelada à fé, a pastora Célia se descreve como alguém que acredita no amor e nas pessoas. A chegada da infraestrutura básica a Homex é comemorada continuamente. “Para eu estar aqui, é um milagre. Hoje tenho minha casa. Foi um desabrochar, como um desabrochar de uma rosa. Foi como um botão e vieram as pétalas”. 

A precariedade extrema se tornava um risco à vida dos moradores da Homex. Evelin Mello, especialista em dignidade habitacional e que tem um empresa de construção de moradias para pessoas de baixa renda, explica que as condições insalubres afetam diretamente a saúde física e mental dos moradores. 

“Ao invés de ser um ambiente seguro, você deixa a pessoa em risco de acidentes, né? E quando a gente também faz uma reforma de acessibilidade para diminuir esse risco, a gente tá diminuindo também a questão de contas, de gastos na questão da saúde pública. Existem pessoas que se sentem tão oprimidas no seu próprio ambiente de residência. O ambiente impacta de forma 100% no bem estar do ser humano, na saúde mental e física”, explica Evelin. 

Olhar para o passado é uma tarefa difícil para Leo. De forma saudosa, revisitar os anos que passaram dá mais força ao presente do líder comunitário. “Passa um filme todo na cabeça. Você liga a torneira e vê saindo, eu não tinha isso em casa. A água saindo me dá felicidade. Você vê os talões de água e energia que estão no seu nome. Não há o problema de cair a água ou energia ou ver meu alimento estragar. Eu pago aquilo que consumo, pago feliz”.

“Me sinto incluído, faço parte da sociedade. A gente faz parte de Campo Grande, não somos mais uma invasão, somos um bairro de Campo Grande, ficou muito boa a frase. Pagamos nossos impostos felizes. Tenho uma água boa, posso comer um arroz sem gosto ruim ou que vai me dar diarreia. Posso tomar banho, tomar água e meu tereré feliz. É prazeroso a vitória!”.

Leo

Água e esgoto tratados são sinônimos de saúde

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Água tratada era sonho da pastora Célia. (Foto: José Câmara).

Tanto Leo, como a pastora Célia tiveram problemas de saúde relacionados ao consumo inadequado de água. Com queixas de diarreia e outras intercorrências na saúde, os dois não conseguiram enumerar a quantidade de vezes que foram ao médico à época que não tinham acesso à infraestrutura básica do sistema hídrico.

Com o aumento habitacional e a chegada de várias famílias, as idas na caixa d’água não atendiam a alta demanda. Houve a ideia de se furar um poço artesiano. Porém, os problemas só aumentaram. 

“Nós só fomos descobrir que a água não era boa depois que o cara que furou o poço foi embora. Já estava passando mal, no posto de saúde. Era algo recorrente, várias famílias. Os problemas eram diarreia, crianças com febre e vários outros problemas. Por ser a maior, o posto de saúde não comportava a gente. As crianças começaram a ficar desidratadas”. 

A saúde pública está completamente ligada com o acesso a um sistema hídrico eficiente e seguro à população. A afirmação não é feita apenas por especialistas na área, como também por dados públicos. 

“Quanto maior os índices de desenvolvimento de saneamento básico que o município tem, reduz a chance da população ficar doente. Para a secretaria de saúde, é um indicativo muito grande. Quanto mais damos acesso à população à água tratada, menor a chance desta população contrair alguma doença ou agravo da transmissão hídrica”, contextualiza a superintendente de vigilância sanitária de Campo Grande, Veruska Lahdo.

A diminuição no número de doenças relacionadas à água contaminada é gigante. Comparados os acumulados de ocorrências de 2005 a 2014 com os últimos dez anos, a queda é de 91% nos registros de Hepatite A, Leptospirose, Esquistossomose e Rotavírus. Os dados são da Sesau (Secretaria de Saúde de Campo Grande). Veja o gráfico abaixo:

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Infográfico detalha dados sobre doenças ligadas à circulação hídrica. (Arte: José Câmara).

Entre os anos de 2005 e 2014, foram registrados 922 casos entre as doenças citadas no gráfico acima. Já de 2015 a 2024, foram 77 ocorrências registradas pelo sistema de saúde pública, em Campo Grande.

A diminuição nos casos de doenças ligadas ao sistema hídrico acompanha o aumento da rede de esgoto e da universalização do acesso à água em Campo Grande. É como uma balança, quando mais pessoas acessam integralmente o sistema hídrico, menos pessoas ficam doentes. 

Os dados da Águas Guariroba mostram que Campo Grande foi um verdadeiro laboratório a céu aberto. O gerente de Meio Ambiente e Qualidade da Águas Guariroba, Fernando Garayo, afirma que o aumento da expansão da rede de esgoto tem relação direta com a redução do número de doenças de veiculação hídrica. 

“Para a gente ter uma ideia, lá em 2003, o índice de expansão, o índice de esgotamento sanitário da cidade, era em torno de 29%. Ou seja, a rede atingia 29% dos lares. Esse número atualmente está em 93%, então houve uma expansão massiva do serviço”. 

Quanto ao acesso à água, o índice é considerado universalizado, em Campo Grande, com 99.9% de cobertura. “Quanto maior o índice de saneamento básico, menor a chance de reduzir a taxa de mortalidade e melhorar a qualidade de vida da população”, garante a superintendente da Sesau. 

Garayo explica que após a maior estratégia da concessionária nos últimos anos é o investimento na expansão massiva da rede de esgotamento sanitário em Campo Grande. 

“Só para se ter uma ideia, nos últimos dois anos, nós tivemos mais de 420 quilômetros de rede de esgoto implantado em toda a cidade, atingindo até as regiões mais periféricas de Campo Grande. O acesso à água tratada e ao esgotamento sanitário tem relação direta com o índice de doenças por veiculação hídrica”.

Fernando Garayo

Como a representante da Sesau, Garayo é categórico ao mencionar a queda das doenças relacionadas à veiculação hídrica. “Nos locais onde as crianças principalmente têm acesso a fossas, ou esgoto a céu aberto, você pode ter um aumento no índice de doenças de veiculação hídrica, que inclusive pode afetar o desenvolvimento das crianças, o desenvolvimento intelectual. Então, o saneamento, tanto a água de qualidade e o esgotamento sanitário, são essenciais para garantir a saúde e o desenvolvimento da sociedade”.

Políticas para o acesso à água asseguram a vida

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Água é recurso vital para todos. (Foto: José Câmara).

As políticas realizadas para garantir o acesso à água e esgoto tratados aos  moradores de Campo Grande são temas de pesquisas acadêmicas na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Neste ano, o professor e engenheiro ambiental Ariel Ortiz orientou um projeto que conseguiu comprovar, através de dados públicos e outros fornecidos pela Águas Guariroba, que o avanço da coleta de esgoto deu mais saúde aos campo-grandenses.

A pesquisa conseguiu catalogar os dados e mostrou que houve a queda de 91% nos casos de doenças diarreicas agudas (DDA), em Campo Grande. Entre os anos de 2006 e 2008 foi apresentado a maior inversão percentual entre saúde e esgotamento. Neste período, a redução de doenças diarreicas foi de 47,58% e o aumento de 123,81% no atendimento urbano de esgoto, aponta o estudo científico. 

“Vimos que à medida que a rede de esgoto foi avançando na cidade, esse número de internações foi reduzindo. É mais ou menos esse o cenário. Ou seja, um bom impacto positivo do aumento da rede coletora de esgoto para evitar a poluição da água. E ao mesmo tempo reduz o número de internações por doenças diarreicas agudas, as famosas DDA”, corrobora Ariel.

Idosos e crianças de 4 anos fazem parte do grupo mais suscetível às DDA, como Ariel explica. Na análise, os pesquisadores também conseguiram identificar uma queda nas internações desta parte da população. 

As DDA são doenças ligadas à veiculação hídrica, seja por causa da água contaminada ou poluída. A contaminação ocorre por meio de bactérias, vírus, dejetos e vermes. 

É como uma conta de matemática básica, onde 2+2=4. Porém, a operação aritmética feita beneficia muitas outras pessoas e assegura a população de diversos problemas, como elenca o especialista da UFMS: 

  • Prejudica a saúde, segurança e bem-estar da população;
  • Aumento das internações por DDA;
  • Perda de produtividade, consequentemente diminuição da participação social e econômica do cidadão; 
  • Desfavorecimento da biodiversidade; 
  • Qualidade da água comprometida.

A água sempre foi usada como palavra de vida ou algo que traz vida. Diante dos dados, entrevistas e histórias, fica um pouco mais claro outro sentido da água na vida de muitos, a de manutenção. Sem acesso a um sistema hídrico de qualidade, populações estariam expostas ainda mais à condições degradantes de saúde pública, econômica e social, de acordo com a análise de Ariel. 

“As comunidades, bairros, vilas, núcleos habitacionais que ainda não têm esses sistemas ou serviços públicos – que são de seu direito – como é o serviço de esgotamento sanitário, acesso à água potável, realmente são bem mais vulneráveis e podem apresentar uma maior porcentagem de casos, tanto de internações por doenças diarreicas, ou por outras doenças de pele. A dignidade habitacional é muito importante neste caso, porque não basta ter um teto para morar, é necessário que outros serviços básicos, como a água sejam assegurados à população. Os direitos devem estar garantidos, assim como a coleta regular dos resíduos ou do lixo e também os sistemas de manejo das águas pluviais para evitar as inundações”. 

As políticas públicas são um conjunto de medidas que os governos adotam para garantir a integridade de direitos da sociedade. Na Homex, alguns passos já foram dados durante uma longa trajetória. Quanto ao sistema hídrico de Campo Grande, o marco do saneamento, aprovado em 2020, trouxe diretrizes para que as cidades do Brasil desenvolvessem ações práticas para a população no tema proposto. 

O gerente de Meio Ambiente e Qualidade da Águas Guariroba, Fernando Garayo, comenta que as metas do “marco” foram fixadas para 2033. Porém, “a meta do marco do saneamento, que é universalizar o acesso ao esgotamento sanitário até 2033, já foi atingida com nove anos de antecedência” em Campo Grande, como afirmou o representante da concessionária. 

Em 2024 foram implantados 190 km  de rede de esgoto em Campo Grande. Segundo a Águas Guariroba, a universalização do sistema chegou aos bairros do Coophavila 2, Seminário e as comunidades Tia Eva e Homex em 2024. Até o fim do ano, a promessa é entregar as obras nas regiões do São Conrado e Caiobá.

“Esse avanço da rede de esgoto transforma a vida das famílias em diversos pontos. Leva dignidade e saúde, pois eles deixam de utilizar fossas sépticas, o que também gera uma economia, sem a necessidade de contratarem uma limpeza dessas fossas. Leva desenvolvimento para a região, com os imóveis se valorizando mais com a infraestrutura do bairro completa. É uma transformação completa”, explica o diretor-presidente da Águas Guariroba, Gabriel Buim.

Os especialistas ouvidos garantem que a conexão do esgoto e o acesso à água tratada são o combo essencial para a mitigação de uma série de doenças. Com a universalização cada vez mais próxima, o ciclo do resíduo também deixa de ser uma preocupação, deixando os riscos ao solo, à população e ao meio ambiente quase que extintos. 

A Homex é um exemplo de uma cidade em transformação. O Leo e a pastora Célia são apenas dois retratos de pessoas que escolheram Campo Grande para viver, ter um lar digno. O que antes era um sonho, passa a se concretizar, mesmo que em passos lentos, com muito suor. 

“Eu me vejo renascida. Eu me vejo realizada em muitas coisas. Muitos diziam que não ia dar certo. Eu vi muita coisa. Hoje, eu estou bem, sou feliz em morar aqui. Me sinto bem em morar aqui. Não vejo uma favela. Eu vejo um bairro estruturado. Um lar”. 

Maria Célia de Andrade Rodrigues





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