Enquanto ocorria a inauguração da 4ª Vara de Violência Doméstica contra a Mulher, localizada na Casa da Mulher Brasileira, nesta sexta-feira (7), um grupo de mulheres protestou pedindo a efetividade das novas medidas prometidas após a morte da jornalista Vanessa Ricarte e outros feminicídios no estado.
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Para desafogar medidas protetivas, TJMS inaugura 4ª Vara na Deam
No entanto, às vésperas do Dia Internacional da Mulher, os novos protocolos não foram implementados em MS. A cobrança não vem somente de quem está na linha de frente na luta contra a violência, mas também em mulheres que foram até a Casa da Mulher Brasileira para protestar e pedir urgência nas mudanças, como a Maria Dalila, que esteve presente.
“Para que a Casa da Mulher Brasileira não seja apenas um espaço físico, muito bem organizado de pessoas que atendam alguém, mas que recebam essas mulheres de verdade, com o coração e dizer: amiga, colega, vem aqui, aqui a sua proteção. Nós estamos desamparadas, essa é a sensação que nós mulheres enquanto sociedade civil mesmo, nós temos muitas profissionais no nosso grupo psicólogas, advogadas, assistente social, tá todo mundo ali reunido e falando: meninas a gente precisa reagir”.
Maria Dalila Teixeira, assessora jurídica
A professora Sara Gloria também esteve presente, e relatou ser preciso diminuir a burocracia nos procedimentos:
“Precisamos de algo que seja realmente mais eficaz, mais rápido, com menos burocracia possível. Porque as mulheres de Mato Grosso do Sul estão morrendo e do Brasil também, e nós precisamos ecoar essa voz, tem que dar um basta”.
Sara Gloria, professora
Protesto marca denúncia
Uma mulher, que pediu para não ser identificada, contou ao Primeira Página que foi vítima de importunação sexual enquanto pilotava sua moto, quando foi surpreendida por mão passando em seu corpo.
“Eu estava de moto, o importador estava numa moto e no momento ele passou a mão em mim. Achei que fosse um assalto ou algo assim, vi que não estava de bolsa e vi que era um assédio mesmo. Anotei a placa da moto e fui até a delegacia realizar o boletim de ocorrência.”
Vítima de importunação sexual
De acordo com a vítima, após um ano, foi chamada novamente à delegacia, para ser ouvida por uma delegada. Porém, ao invés do acolhimento, a mulher diz que recebeu um conselho.
“Ela me orientou a não prosseguir com o processo, porque não daria muita coisa pra esse importunador. Na hora eu fiquei chocada, eu fiquei sem saber o que fazer. Mas como assim, eu vou desistir? Não, se ele tem o CPF, se ele reside na cidade, eu vou prosseguir com o processo, sim.”
Vítima de importunação sexual
A vítima contou que a situação se repetiu na fase judicial, e durante uma audiência, também foi questionada por uma juíza.
“Ela falou que, como é que ela prenderia uma moto, se eu tinha apenas características da moto, e não tinha do importunador.
Vítima de importunação sexual
Mesmo com as abordagens, a vítima seguiu com o processo e o agressor foi condenado a pagar multa. Diante do que passou, a vítima diz que trauma é algo difícil a ser curado.
“O que importa é o que a gente está passando no momento. No modo geral pode ser apenas uma importunação, mas pra gente que passa, a mulher que passa por isso, é um trauma que é difícil de ser curado.”
Vítima de importunação sexual
A espera das medidas
Seis mulheres foram assassinadas em MS neste ano, e todas foram vítimas de ex-companheiros. Após o feminicídio de Vanessa Ricarte em Campo Grande, medidas foram anunciadas para corrigir falhas existentes no sistema de proteção, como a capacitação de policiais para atuar na escolta de mulheres, e um acordo de cooperação entre Governo do Estado e Tribunal da Justiça.
Autoridades já reconheceram falhas no sistema de atendimento e diversas medidas foram anunciadas.

Uma delas foi uma força tarefa criada pelo Governo do Estado para analisar mais de seis mil boletins de ocorrência que estão represados na DEAM. O governo afirma que os trabalhos de análise já estão em andamento, mas não deu detalhes de como a operação está sendo realizada.
Outras medidas estão previstas em um acordo que ainda não saiu do papel, entre a SEJUSP (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública) e o TJ-MS (Tribunal de Justiça do Estado).
Se efetivado, o convênio prevê a intimação dos agressores através de mensagem por aplicativo, e a capacitação de policiais militares para atuarem como oficiais de justiça, na escolta das vítimas e no cumprimento de medidas protetivas.
“O documento já está pronto, estamos agora tentando uma agenda compatível entre o governador e o presidente do Tribunal de Justiça para que nos próximos dias ele seja assinado, e uma vez assinado, haverá capacitação desses policiais no período de 30 a 60 dias, e eu acredito que nesse prazo ele já começa a ter efetividade, ou seja, os policiais já começam na prática auxiliar o judiciário no cumprimento das medidas produtivas.
Eduardo Siravegna, juiz auxiliar da presidência do TJMS
Para o Conceição de Maria, co-fundadora e superintendente do Instituto Maria da Penha, o suporte em toda a rede de apoio é fundamento para a vítima.
“A rede primária pode até falhar, os familiares não darem apoio, a rede secundária no caso os amigos, pode falhar também. Mas o estado não pode falhar. Então, se ela bater na porta da delegacia 1000 vezes , tem que se abrir a porta pra ela 1000 vezes. Porque se ela não tomou atitude ainda, é que ela ainda não teve conhecimento do que pode acontecer com ela. Então o estado tem que amparar, tem que dar apoio psicossocial, pra que ela consiga tomar a atitude de denunciar. Por isso que tem que ter capacitação periódica para que essa revitalização da mulher, quando ela chegar no equipamento seja ele qual for, não aconteça.
Conceição de Maria, co-fundadora e superintendente do Instituto Maria da Penha