As eleições na Venezuela causaram um terremoto político na região. Com algumas exceções – entre as quais só se contam Cuba, Nicarágua e Bolívia – a maioria dos países da América e da Europa exigiram transparência do governo de Nicolás Maduro na publicação dos resultados.
No entanto, haviam nuances. Enquanto alguns chegaram ao ponto de ignorar os números publicados pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e apelaram a ações conjuntas visando o “respeito à vontade popular”, outros – países centrais devido ao seu papel na região e às suas fronteiras com a Venezuela , como Brasil, Colômbia e até México – optaram pela moderação.
Na segunda-feira (29), o governo de Maduro redobrou a aposta contra aqueles que questionavam os resultados e anunciou, através de um comunicado, que expulsaria o pessoal diplomático da Argentina, Chile, Costa Rica, Peru, Panamá, República Dominicana e Uruguai.
“É uma situação atípica para as regulamentações diplomáticas e aduaneiras; Não está contemplado nem na Convenção de Viena sobre relações diplomáticas nem nas Convenções de Caracas ou Montevidéu sobre asilo. É uma suspensão das relações diplomáticas sem romper as relações diplomáticas”, explicou à CNN o ex-vice-chanceler da Argentina e ex-embaixador do país na ONU, Fernando Petrella.
Esta situação manteve-se em geral, com exceção do Peru, país com o qual a Venezuela anunciou nesta quarta-feira (31) que romperia relações diplomáticas. No caso da Argentina, a expulsão de pessoal diplomático afeta os seis venezuelanos atualmente asilados na embaixada argentina em Caracas.
Elsa Llenderrozas, integrante da Rede de Cientistas Políticos e diretora do programa de Ciência Política da Universidade de Buenos Aires, disse à CNN que a expulsão dos diplomatas argentinos foi acompanhada de diversas ações de intimidação à embaixada, além da corte do fornecimento de água e eletricidade. “Este é um ato grave que viola o direito internacional”, disse.
O que o isolamento diplomático significa para Maduro?
Muito antes do anúncio da expulsão de diplomatas de sete países esta semana, a Venezuela já havia optado pelo isolamento político na região. Por exemplo, ao retirar-se da Organização dos Estados Americanos (OEA), que nesta quarta-feira (31) realiza uma reunião.
Fernando Petrella, antigo vice-chanceler da Argentina e antigo embaixador do país na ONU, assegura que o isolamento convém a Maduro: “Quanto menos pessoas meterem o nariz no que está acontecendo na Venezuela, melhor para ele. Por exemplo, a OEA é normalmente uma observadora automática das eleições realizadas nos países do hemisfério. Para um país que violou as normas eleitorais, como é o caso da Venezuela, durante muitos anos, o isolamento da OEA e da região o favorece”.
Além disso, o isolamento físico deve agora ser adicionado ao isolamento político. A Venezuela suspendeu os voos com o Panamá, por exemplo, que é uma ligação aérea fundamental porque todos os voos para o norte do continente, incluindo os Estados Unidos, partem de lá.
“Isso implica custos materiais mais elevados para o país e para os venezuelanos. E atira a Venezuela nos braços dos seus aliados extra-regionais (Rússia, China e Irã), o que certamente radicalizará ainda mais o regime”, acrescentou Elsa Llenderrozas.
Contudo, nos 25 anos em que está no poder, o chavismo já passou por fases de maior ou menor isolamento internacional, incluindo sanções econômicas, das quais conseguiu sair com mais ou menos sucesso.
O diretor do Centro de Estudos Políticos e Governamentais da Universidade Católica Andrés Bello (UCAB), Beningo González, explicou à CNN desde Caracas que o isolamento é uma estratégia, concebida temporariamente.
“A Venezuela busca se isolar dos governos que tentam influenciar a situação interna para que os resultados eleitorais sejam reconhecidos. A ideia é romper essa relação pelo menos enquanto a crise interna for superada. com esses países, mas enquanto isso quer tirar do caminho os governos que apoiam e encorajam a oposição, ou que até concedem asilo a algumas pessoas que se sentem perseguidas ou ameaçadas”, disse.
“A atitude é se isolar para fazer o que quiser por dentro, reprimir com muita força como já começou a ser feito, e depois fingir que nada aconteceu aqui quando tudo voltar ao normal. Uma vez reconhecido o governo de Maduro, todos poderão voltar a falar e fazer negócios com a Venezuela”, acrescentou.
Para além da estratégia de Maduro e da sua eficácia, surge a questão de qual deveria ser a estratégia para uma região que não está imune a uma crise com estas características.
Vários centros de estudos venezuelanos, incluindo a UCAB, estimam que entre 8 e 10% dos venezuelanos poderão deixar o país nos próximos meses, afetando vizinhos como a Colômbia e o Brasil, entre outros. Isto equivale a cerca de dois milhões de pessoas, o que se poderia somar aos oito milhões que já partiram nos últimos anos, segundo dados do ACNUR.
Por tudo isso, o diplomata Petrella sugere cautela. “Promover o isolamento com países como a Venezuela não é o mais conveniente, assim como o isolamento de Cuba não foi produtivo na altura. Devemos lembrar, claro, que Cuba é uma ilha e a Venezuela não; portanto, o seu isolamento poderá ser ainda menos eficaz e mais complicado com os países com os quais partilha fronteira.”, explicou.
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