Celular de advogado morto entregou esquema de venda de sentença em MT; veja diálogos


Diálogos interceptados pela Polícia Federal expuseram um esquema sofisticado de venda de decisões judiciais envolvendo servidores e advogados que atuavam em processos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Judiciário de Mato Grosso.

Mensagens extraídas do celular de advogado assassinado revelaram negociações (Foto: Tânia Rêgo)

A investigação aponta que intermediadores recebiam propina para manipular julgamentos e acessar informações sigilosas, beneficiando interesses privados.

Mensagens extraídas do celular do advogado Roberto Zampieri, assassinado em dezembro de 2023, foram cruciais para detalhar o esquema. Segundo a Polícia Federal, Zampieri e o empresário Andreson de Oliveira Gonçalves lideravam uma rede de influência que envolvia advogados, servidores públicos e, possivelmente, magistrados.

Prisao Andreson
Lobista Andreson de Oliveira foi preso em operação contra venda de sentença em MT (Foto: TVCA)

Conversas comprometedoras

Os diálogos entre Andreson e Zampieri, registrados entre 2019 e 2023, revelam a entrega de valores em troca de minutas de decisões judiciais e a intermediação de interesses em processos relevantes no STJ.

Um dos casos citados foi a troca de mensagens relacionadas a um processo, sob relatoria da ministra Isabel Gallotti. Em uma conversa, Andreson teria encaminhado uma minuta de decisão para Zampieri e cobrado o pagamento:

Andreson: “Aroldo diz que ia mandar os 200 na sua conta.”
Zampieri: “Não vai mandar hoje, só segunda. Acabou de me mandar mensagem agora.”

Outras mensagens mostraram Andreson negociando diretamente com uma pessoa identificada como “Juliana”, ligada a processos do tribunal, para confirmar decisões favoráveis. Em outro trecho, ele garantiu a Zampieri que “tudo estava certo” após a intermediação.

Advogado Roberto Zampieri foi morto com cerca de 11 tiros, no início de dezembro em Cuiabá. (Foto: Reprodução)
(Foto: Reprodução)

Servidores envolvidos

A investigação identificou a participação ativa de servidores do STJ, como Daimler Alberto de Campos, ex-chefe de gabinete da ministra Isabel Gallotti. Em um diálogo, Andreson menciona cobranças feitas por Daimler sobre pagamentos relacionados a processos:

Andreson: “O Daimler me ligou agora perguntando dos R$ 50.000 que faltam daquele caso da Cátia lá.”

A apuração revelou que Daimler teria acessado minutas internas de decisões antes da publicação oficial, repassando-as ao grupo. As movimentações financeiras suspeitas foram rastreadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), reforçando os indícios de sua participação.

Um dos processos investigados incluem ações estratégicas do Judiciário de Mato Grosso. Um deles sob a relatoria da ministra Nancy Andrighi, em que o nome de uma possível intermediadora, identificada como “Valesca”, foi citado. Mensagens mostraram Zampieri pedindo que Andreson verificasse uma decisão com sua “amiga”:

Zampieri: “Pode falar? Anderson, veja com sua amiga. Pelo AMOR DE DEUS!!!!!!”
Andreson: “Já falei com a Valesca.”

Além disso, os diálogos indicaram que decisões envolvendo grandes propriedades rurais em Mato Grosso eram parte do esquema. Em uma conversa, Andreson e Zampieri trataram de um processo envolvendo uma fazenda, mencionando pagamentos que seriam repassados à intermediadora.

Estrutura sofisticada

A PF descreve o esquema como altamente articulado, com divisão de tarefas entre intermediadores, advogados e servidores públicos. A função de Andreson era central no esquema: ele negociava diretamente com clientes e servidores, cobrava valores e organizava a logística de entrega das decisões.

O esquema não se limitava ao STJ. Diálogos mostram que as práticas ilícitas também atingiam o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, onde processos de alto interesse econômico eram manipulados em troca de propina.

Veja abaixo a nota do TJMT na íntegra:

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) informa que tomou ciência da deflagração da Operação Sisamnes, conduzida pela Polícia Federal nesta terça-feira (26/11).

O TJMT reafirma seu compromisso com a transparência, a legalidade e a colaboração com as autoridades competentes, colocando-se à disposição para o fornecimento de informações necessárias ao andamento das investigações.

O Poder Judiciário enfatiza que cumpre integralmente as determinações do Supremo Tribunal Federal e adota as medidas cabíveis para assegurar o esclarecimento dos fatos.

A instituição mantém suas atividades regularmente, reforçando sua missão de servir à sociedade e ao Estado por meio da distribuição da justiça.

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