Em um debate realizado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) na terça-feira (18), o impacto dos agrotóxicos na saúde da população foi o tema central. Durante a audiência pública, que discutiu a distância mínima para aplicação de agrotóxicos, pesquisadores, médicos e representantes de entidades ligadas à saúde apresentaram estudos que associam o uso intensivo de defensivos agrícolas ao aumento de casos de câncer e outras doenças graves no estado.
O Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) analisou dados coletados entre 2008 e 2017 nas principais regiões agrícolas do estado, identificando quase 11 mil internações por câncer infantojuvenil (de 0 a 19 anos).
Os casos de leucemia representaram 50,2% do total, enquanto as neoplasias malignas corresponderam a 10%. No mesmo período, 406 mortes foram registradas em decorrência dessas doenças.
Durante a pesquisa, o uso de agrotóxicos no estado atingiu a marca de um trilhão de litros aplicados em 117 milhões de hectares de áreas de plantio.
O pesquisador da UFMT, Wanderlei Pignatti, alertou que a redução da distância mínima para aplicação desses químicos pode dobrar os riscos de desenvolvimento de doenças.
“Quanto mais perto da lavoura, quanto mais a água contaminada, maior é a incidência de câncer de mama. Já temos artigo publicado com relação a isso e há diversos estudos no mundo todo fazendo referência a esse levantamento”, destacou Pignatti.
A Associação de Apoio à Criança com Câncer (AACC) também apresentou dados que corroboram as pesquisas da UFMT. A entidade citou levantamentos do Instituto Nacional de Câncer (INCA), órgão vinculado ao Ministério da Saúde, que se posiciona contra a flexibilização das regras para o uso de agrotóxicos.
Segundo o INCA, substâncias como glifosato – o agrotóxico mais utilizado no Brasil – além de pentaclorofenol, malationa, diazinona e 2,4D, podem estar relacionadas ao aumento da incidência de linfoma de Hodgkin e cânceres de pele, mama e próstata, os mais recorrentes no país.
Márcia Sarpa de Campos Melo, coordenadora de Prevenção e Vigilância do Câncer do INCA, reforçou a necessidade de estabelecer limites rigorosos para a aplicação de agrotóxicos.
“A gente entende que qualquer distância das pessoas que estão sendo expostas é importante, por isso precisamos ficar muito atentos”, alertou.
No entanto, durante a audiência, essas teses foram contestadas pelo médico toxicologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Angelo Trapé.
Ele argumentou que as evidências apresentadas não são conclusivas e que a aplicação de agrotóxicos segue protocolos de segurança para minimizar os riscos à saúde.
Veja o vídeo:
Além disso, representantes do setor agrícola defenderam a manutenção do uso dos produtos químicos e a redução da distância mínima para sua aplicação.
O produtor rural de Campo Verde e integrante da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Fernando Ferri, afirmou que a agricultura do estado depende desses insumos para garantir a produtividade e que os produtores seguem todas as recomendações técnicas para evitar impactos à saúde pública.
A discussão sobre o projeto de lei segue na ALMT e deve continuar gerando controvérsias entre os setores agrícola, ambiental e de saúde antes da decisão final sobre a proposta.
Médica hostilizada
Durante a audiência, a médica Otilia Maria Teófilo fez um pronunciamento que, inclusive, é contrário à proposta de redução das distâncias mínimas para a aplicação terrestre de agrotóxicos em áreas próximas a nascentes e mananciais de água, em Mato Grosso.
No final do pronunciamento, a médica começou a recitar um poema e os presentes começaram a se manifestar. Os gritos ao fundo apontam a insatisfação das pessoas com o tempo de fala da médica que estaria extrapolando o permitido.
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