Jovem descobre adoção ilegal ao tirar cidadania portuguesa e encontra pais após 28 anos

CNN Brasil


Um jovem descobriu que foi vítima de uma adoção ilegal e encontrou seus pais biológicos depois de 28 anos. João Mallmann contou sua história em dezenas de vídeos nas redes sociais, onde denunciou uma vida de mentiras e agressões.

O médico de 28 anos mora em Curitiba, no Paraná, e está no fim de sua residência médica em urologia. Ele decidiu obter a cidadania portuguesa em dezembro de 2023, quando descobriu diversas inconsistências na documentação da família.

Idade e relacionamentos anteriores da mãe, mortes dos avós, existência de outros parentes e sua própria origem foram algumas das descobertas de João logo no primeiro momento.

O jovem, que antes se identificava como João Dias, denunciou o relacionamento com seus pais adotivos e cada etapa da jornada pelos seus pais biológicos e para desvendar as mentiras feitas por seus pais durante toda a sua vida.

Leia abaixo a história contada pelo jovem nas redes, em uma série de vídeos chamada de “Foi assim que descobri que minha família era muito suja”. João publicou os vídeos durante o mês de outubro.

Primeiras inconsistências

Em dezembro de 2023, o jovem foi a um cartório durante o processo de obtenção da cidadania e obteve a certidão de casamento dos pais. “Quando peguei, me deparei com um monte de inconsistências sobre coisas que meu pais me falavam, que lendo o documento não batia”.

Sua mãe aparecia sendo 9 anos mais velha no documento. O casamento dos pais constava em 2006, 10 anos após seu nascimento. “Eles falavam que tentando engravidar quatro anos antes de eu nascer e eram casados”, relatou João.

Segundo o jovem, eles também mentiram o endereço de residência na certidão. Além disso, ele viu pela primeira vez os nomes dos avós maternos. “Falava pouco dos pais dela, principalmente que haviam morrido antes de eu nascer. Mas, eles morreram em 2011 e 2020, meu avô e minha avó”, revelou.

João ainda contou que sua mãe falava que era filha única, mas ela tinha cinco irmãos. Ela também era divorciada e dizia ao filho que “seu pai foi o único homem da minha vida”.

“Tudo isso gerou um alerta vermelho na minha cabeça, tem alguma coisa acontecendo aqui e eu vou descobrir”, afirmou.

Encontro dos tios “adotivos”

A pesquisa pelos parentes começou pelos tios da família adotiva, que estavam vivos. Para ter mais repertório na história, ele achou a certidão de casamento antiga da mãe de 1982. João conta sobre suspeitas de adoção desde pequeno.

“Sempre achei que tinha alguma coisa estranha acontecendo. Desde criança eu perguntava ser eu era adotivo e eles prontamente respondiam que não. Mas sempre me senti diferente de personalidade, sempre me achei muito diferente deles“, afirmou.

João hesitou alguns dias sobre a melhor forma de contatar os tios. Apesar da ansiedade, o jovem disse que a resposta não poderia ter sido melhor. “Uma das tias disse ‘é claro que eu quero conversar contigo e saber que tenho um sobrinho’. Isso me deu uma ponta de esperança de ter algo que eu sempre quis, ter uma família”.

O médico revelou um ambiente tóxico e agressivo dentro com seus pais adotivos. “Nunca houve apoio emocional, me sentia completamente sozinho naquela família. Minha infância não foi nem um pouco boa, me tratavam muito mal, apanhei muito, meu pai bebia muito quando eu era criança”.

Ele ainda disse que sua mãe fazia diversas ofensas gordofóbicas, como “você está tão gordo que vai precisar de um guindaste para te levantar”. “Tenho muitos motivos para acreditar que ela tem transtorno de personalidade”, completou.

Por quê?

João questionou os tios por que sua mãe fez tudo isso. “Todos os tios disseram: ‘eu não sei’. Ela tinha se divorciado e disse que ia se mudar para o Paraná, mas nunca mais entrou em contato. Todos tentaram encontrar ela, mas não conseguiram, era uma família muito humilde”, lamentou.

A família até encontrou a mãe de João em 2020, por meio de um primo, mas decidiram não fazer contato, porque acharam que ela não gostaria de ser contatada. Eles descobriram sobre a existência do médico, mas decidiram manter distância.

“Eu não merecia ter passado por isso, nenhuma criança. Eu não mereço. Mas tem uma coisa muito positiva, que ganhei uma família. Todos ficaram muito felizes”, desabafou João.

Na conversa com os parentes, João descobriu outros problemas de sua mãe, como o tratamento com a família e se disse livre de não pertencer aquele núcleo familiar. O homem também contou sobre quando decidiu confrontar seus pais adotivos com as descobertas.

“Minha mãe não falava comigo há cinco anos. Tentei conversar com eles e foi uma conversa horrorosa. Fui muito humilhado, meu pai avançou para cima de mim, mas não chegou a me bater. Fiquei muito triste, bravo e ansioso. Meu pai começou a falar aos outros que eu era um “drogadito” e um mentiroso”. 

Algumas evidências que deixaram claro para João que havia sido adotado ilegalmente foi um álbum de fotos do seu nascimento e a obtenção da sua certidão de nascimento. O jovem se cadastrou em plataformas de bancos de DNA para tentar achar sua família biológica.

Encontro do pai

Os primeiros resultados foram compatíveis com muitos parentes, mas todos de gerações muito anteriores. Mesmo assim, ele se juntou com duas amigas e começaram a montar árvores genealógicas para encontrar conexões.

Ele encontrou um parente, Adão Mallmann. “Fomos perguntando a cada parente dele se tem alguma história na família de uma criança que foi dada, doada, adotada, perdida ou roubada”.

O trio chegou em um tio biológico que indicou, por coincidência, um irmão biológico de João. O irmão contou que a família era do Rio Grande do Sul e foram moram na cidade de Turvo, no norte paranaense.

Também foi revelado que seu pai, em 1995, teve uma relação extraconjugal com uma funcionária da chácara em que eles moravam. “Foi assim que surgi no mundo”. Após um teste de DNA, a paternidade foi confirmada.

O pai contou que a mãe de João foi a Guarapuava (PR) em 1996, onde o jovem já sabia que tinha nascido, para ter a gravidez. “É muito digno saber de onde eu vim, saber quem eu sou”. 

No último dia 24 de outubro, o médico compartilhou a mudança de seu sobrenome nas redes sociais de Dias para Mallmann. “É sobre não ser Dias. Não pertencer a um ciclo que eu não admiro. Dias acabou se tornando um sinônimo de violência na minha vida”.

Encontro da mãe

João soube das primeiras informações por seu pai. Mas, após uma das amigas publicar as buscas nas redes, uma usuária comentou a mesma história que seu pai havia lhe contado: era sua irmã.

“Ela não sabia da minha existência”, contou João. Depois de uma primeira hesitação, a irmã fez a ponte entre João e mãe, que conversaram primeiro pelo telefone.

“Eu não preciso do teste (de DNA) para ter certeza que era minha mãe. Tudo que ela falava batia com o que meu pai falava”, afirmou em um vídeo. A mãe contou ao filho que não conseguia criá-lo quando nasceu.

“Ela disse: ‘quando nasci, não tinha para onde me levar. Não tinha condições de criar uma criança naquele momento. Eu nunca na minha vida teria te dado se o obstetra e a enfermeira do dia não tivesse falado para mim no dia que tinha o casal ótimo querendo te adotar”.

Segundo João, sua mãe sofreu muito e passou noites chorando pela falta de seu filho. Ela confirmou a data de nascimento do jovem em 19 de janeiro de 1996.

“Ela disse ter muito orgulho de mim. E eu passei minha vida inteira tentando fazer com que minha mãe adotiva tivesse orgulho de mim. E a sensação de nunca ser suficiente é desesperadora”, desabafou o jovem muito emocionado.

Ao final da série de vídeos, o médico ainda compartilhou uma grande sensação de felicidade. “Para quem não tinha família nenhuma tenho pais, que me deram irmãos, sobrinhos e a parte da minha família adotiva. Para uma criança que passou a infância inteira se sentindo sozinha, eu nunca mais serei sozinho”.

A CNN tenta contato com a defesa dos pais adotivos de João Mallmann para um posicionamento.



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