Ao menos 773 corpos foram registrados em necrotérios hospitalares dentro e ao redor da cidade de Goma em 30 de janeiro, após uma ofensiva do grupo armado M23, apoiado por Ruanda, de acordo com o Ministério da Saúde da República Democrática do Congo neste sábado (1º).
A capacidade dos necrotérios foram excedidas e ainda há mais corpos nas ruas devido à crise, acrescentou o Ministério.
A pasta informou que 2.880 feridos foram registrados entre 26 e 30 de janeiro.
Os rebeldes do M23, liderados pelos tutsis, tomaram na terça-feira (28) Goma, a maior cidade do leste da RD Congo e capital da província de Kivu do Norte, que abriga lucrativas minas de ouro, coltan e estanho.
Eles então seguiram em direção a Bukavu, no Kivu do Sul, mas pareceram ser detidos na sexta-feira(31) por tropas congolesas apoiadas pelo exército do Burundi.
Bem treinado e profissionalmente armado, o M23 é o mais recente de uma longa linha de movimentos rebeldes apoiados por Ruanda a surgir nas voláteis fronteiras orientais d RD Congo após duas guerras sucessivas decorrentes do genocídio de Ruanda em 1994.
A última escalada agravou uma crise humanitária de longa data que levou milhares de pessoas a buscar abrigo em Goma após fugir dos combates entre o M23 e as tropas lese da RD Congo.
Milhares de pessoas chegaram à cidade neste mês enquanto os rebeldes avançavam.
Organizações humanitárias tiveram dificuldades para operar durante os dias de intensos combates em torno da captura de Goma, apoiando hospitais sobrecarregados e fornecendo ajuda em meio a saques generalizados de seus armazéns e fogo cruzado que também afetou sua própria equipe.
A organização Médicos Sem Fronteiras disse na sexta-feira (31) que tinha apenas um pequeno estoque de medicamentos e parou de ajudar pessoas em campos de deslocados. O Programa Mundial de Alimentos disse que havia retirado funcionários e suspendido atividades.
Houve escassez de suprimentos médicos, ambulâncias e sacos mortuários, disse o Ministério da Saúde da RD Congo, com preocupações de segurança ainda limitando o acesso a partes da cidade.
Deslocados voltam para casa
A vida cotidiana foi retomada em Goma no sábado (1°), após intensos combates que levaram a violações dos direitos humanos, incluindo execuções sumárias, bombardeamentos de campos de deslocados, relatos de violações em grupo e outras formas de violência sexual, de acordo com a ONU.
O M23 tem a intenção de mostrar que pode restaurar a ordem e governar. Energia e água, que foram cortadas por dias, foram parcialmente restauradas, enquanto os moradores foram informados de que as aulas seriam retomadas e que as pessoas deslocadas seriam autorizadas a voltar para casa.
Os mercados reabriram, embora a comida continuasse escassa, com muitas barracas vazias. Um cliente disse que a internet móvel ainda estava inativa.
Três fontes humanitárias afirmaram que as pessoas estavam deixando os campos de deslocados. Corneille Nangaa, chefe da coalizão política que apoia o M23, Alliance Fleuve Congo, disse que as pessoas estavam saindo porque as estradas tinham reaberto, e que seu objetivo era facilitar seu retorno para casa “assim que as condições permitissem”.
“Vamos pedir apoio a todas essas ONGs (para isso), mas o desafio é fazer tudo, passar da ajuda humanitária para o desenvolvimento”, disse Nangaa na sexta-feira (31).
O avanço rebelde está parado
Os combates pareciam ter cessado no sábado (1º) depois que o exército reagiu.
O líder da sociedade civil local, Justin Mulindangabo, disse que o exército do Congo havia retomado as aldeias de Mukwija, Shanje, Numbi e Nyamasasa e outras localidades no território de Kalehe, a meio caminho entre Goma e Bukavu.
Mulindangabo, que mora em Kavumu, uma cidade 35 km ao norte de Bukavu, disse que os moradores estavam retomando a vida cotidiana.
Outra fonte da sociedade civil disse que não houve combates em Kalehe na manhã de sábado. Uma autoridade local disse que o exército havia fortalecido sua posição em Kalehe e retomado várias aldeias, incluindo Mukwija, embora os combates continuassem em outros lugares.
O exército do da RD Congo não respondeu a um pedido de comentário no sábado.
Burundi, que faz fronteira com Ruanda e RD Congo, tem reforçado as forças de segurança da RD Congo em Kivu do Sul e em outros lugares.
Na sexta-feira (31), o presidente do Burundi, Evariste Ndayishimiye, alertou que retaliaria qualquer invasão ruandesa em seu país e “generalização” do conflito.
O ministro das Relações Exteriores de Ruanda, Olivier Nduhungirehe, disse no sábado (1º) que era o Burundi que estava tentando derrubar seu governo em Kigali.
A mais recente escalada do conflito gerou críticas internacionais a Ruanda e repetidos apelos por um cessar-fogo.
Ruanda há muito tempo nega apoiar o M23 e diz que está se defendendo. O Congo nega as alegações e acusa Ruanda de usar o M23 para pilhar minerais valiosos.
O que é o M23?
O nome M23 se refere ao acordo de 23 de março de 2009, que encerrou uma revolta anterior liderada por tutsis no leste da RD Congo.
É o mais recente grupo de rebeldes liderados por tutsis étnicos apoiados por Ruanda, que têm causado tumulto na RD Congo desde o rescaldo do genocídio em Ruanda há trinta anos, quando extremistas hutus mataram tutsis e hutus moderados e depois foram derrubados pelas forças lideradas por tutsis que ainda dominam Ruanda.
O M23 acusa o governo da RD Congo de não cumprir o acordo de paz e integrar totalmente os tutsis congoleses ao Exército e ao governo.
O grupo também promete defender os interesses tutsis, particularmente contra milícias étnicas hutus, como as Forças Democráticas para a Libertação de Ruanda (FDLR), fundadas por hutus que fugiram de Ruanda após participar do genocídio de 1994 de quase 1 milhão de tutsis e hutus moderados.